Tempos liquidamente complexos

O desamor destes tempos complexos tem me feito chorar e perder o sono. Solidariamente estou ao meu lado e seguro minhas próprias mãos quando a angústia e o desespero me visitam. Noites escuras são seguidas por noites escuras, a desumanidade das notícias afetam nossa sanidade e é preciso grande esforço para não sucumbir. Minha subjetividade está manchada por rios poluídos (acaso não sabem que um rio é como um Deus?) e várias poças de sangue facilmente evitáveis se a vida, não o patrimônio, fosse o maior bem a ser preservado. Aqui dentro do peito há um buraco escavado por tantas ações mineradoras, exploradoras e destruidoras da nossa integridade, saúde, beleza e força.

Sob a égide do capitalismo nos tornamos também exploradores uns dos outros, arrancando o que queremos das nossas relações e sem qualquer cerimônia, partimos, deixando para trás um rastro de desmatamento e garimpo ilegal nos corações alheios. O amor também está contaminado por mercúrio, não apenas os rios. As relações não são apenas líquidas como apontou Bauman (2004), são também predatórias com cada um defendendo seu próprio individualismo. Caminhamos afirmando independência, esquecidos que a teia da vida é formada de interdependência e nutrida por solidariedade e partilha.

Não há caminho para nós seja como seres humanos, como irmãos, compatriotas ou como amantes na liquidez e superficialidade com que temos atravessado a vida, e é bom destacar que isso não é viver. Estamos todos fragilizados e adoecidos, famintos de fato, por um bom prato orgânico e substancial de vida.

Tatiane Moreira


Referências:

BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos. Ed. Zahar, 2004.

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